Incerteza requer flexibilidade e ritmo de cortes de juros pode ser mais lento, diz Copom em ata

Comitê pondera que seria ‘equívoco’ entender alteração na comunicação como indicação de mudança no ciclo da política de juros

Nathalia Garcia BRASÍLIA

A incerteza sobre a velocidade do processo de desinflação requer mais flexibilidade e, na avaliação de alguns membros do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central, ela pode levar a um ritmo de corte de juros mais lento à frente, conforme ata divulgada nesta terça-feira (26).

O comitê, contudo, pondera que seria um “equívoco” entender a alteração na comunicação sobre os passos futuros da Selic como uma sinalização de mudança no ciclo da política de juros.

O colegiado do BC vê como apropriado aumentar seu grau de liberdade diante da maior incerteza nos cenários internacional e doméstico, embora o cenário-base trabalhado pelo comitê não tenha sido alterado significativamente entre os encontros de janeiro e março.

Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em São Paulo – Adriano Vizoni – 29.fev.2024/Folhapress

“O cenário-base não se alterou substancialmente, mas, com as incertezas do cenário, julgou-se apropriado ter maior flexibilidade de política monetária. Ainda que a comunicação já contivesse uma condicionalidade embutida, avaliou-se que não trazia a flexibilidade requerida”, disse.

No comunicado divulgado logo após a decisão, na semana passada, o comitê deixou de se comprometer com novos cortes da mesma magnitude (0,5 ponto percentual) “nas próximas reuniões” e abandonou o plural no texto, sinalizando uma redução da mesma intensidade apenas no próximo encontro, em maio.

“Tal alteração reflete tão somente uma análise de custo-benefício da utilização desse instrumento adicional de política monetária. Por fim, reforçou-se que seria um equívoco interpretar a mudança na sinalização futura como uma indicação de alteração do ciclo de política monetária compatível com o cenário-base”, acrescentou.

De acordo com o colegiado do BC, uma retirada tardia do “forward guidance” (prescrição futura) poderia ser vista como uma promessa não cumprida e deveria ser evitada, pois poderia ter impacto sobre a credibilidade da comunicação do Copom e provocar volatilidade excessiva.

“Alguns membros argumentaram ainda que, se a incerteza prospectiva permanecer elevada no futuro, um ritmo mais lento de distensão monetária pode revelar-se apropriado, para qualquer taxa terminal que se deseje atingir”, afirmou.

Ao detalhar os fatores que tornaram o cenário mais incerto, o Copom citou que surgem dúvidas com relação à velocidade de desinflação de serviços em função da atividade econômica mais resiliente.

Os membros observam que houve aceleração de rendimentos e da massa salarial, reforçando o diagnóstico de um mercado de trabalho dinâmico. Diante disso, o comitê fala em seguir acompanhando os dados em profundidade por conta da dificuldade de se chegar a uma conclusão assertiva sobre o tema.

“O comitê notou que um processo desinflacionário mais lento, tanto domesticamente quanto globalmente, não constitui o cenário-base, mas foi incorporado como fonte de incerteza. Esse aumento de incerteza prescreve cautela na condução da política monetária”, afirmou.

Quanto à conjuntura internacional, o colegiado do BC disse que o processo de desinflação se mostra mais incerto diante da resiliência da atividade econômica nos Estados Unidos e de seu impacto nas condições financeiras globais.

“Além disso, os impactos da política monetária sobre a atividade e a inflação também geram incerteza na velocidade da desinflação em diversos países”, acrescentou.

Na última quarta-feira (20), o Copom reduziu a taxa básica de juros (Selic) pela sexta vez seguida em 0,5 ponto percentual, de 11,25% para 10,75% ao ano.

Com esse novo corte, o colegiado do BC manteve a intensidade aplicada desde o início da flexibilização de juros, em agosto do ano passado.

No cenário de referência do Copom, as projeções de inflação para este ano e para o próximo se mantiveram em 3,5% e de 3,2%, respectivamente.

“Com relação à inflação, tal como esperado no segundo estágio da desinflação, a velocidade de desinflação se reduz, exigindo serenidade e moderação na condução da política monetária”, disse.

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