Facilidade em mudança no arcabouço fiscal gera temor de novos dribles

Para especialistas, articulação rápida e feita sem alarde arranha credibilidade da política de controle das contas públicas

Adriana FernandesIdiana Tomazelli – BRASÍLIA

A facilidade com que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) conseguiu alterar o arcabouço para antecipar a ampliação dos gastos em 2024 surpreendeu economistas, arranhou a credibilidade da política fiscal e acendeu um alerta para o risco de novas mudanças na regra.

A rapidez da articulação, feita sem alarde e descoberta apenas após a aprovação do texto pelo plenário da Câmara, deflagrou o temor de que o roteiro se repita no futuro, quando o Executivo enfrentará novos obstáculos ao seu desejo de elevar despesas.

Procurados, os ministérios da Fazenda e do Planejamento não se pronunciaram oficialmente sobre o tema.

Nos bastidores, a Fazenda buscou minimizar o impacto da mudança com a justificativa de que a espinha dorsal do arcabouço foi mantida.

A alteração não levou, isoladamente, a uma piora nas projeções para o resultado das contas públicas, mas especialistas ouvidos

Se chancelada pelo Senado, essa seria a terceira alteração relevante na lei que criou o novo marco fiscal em pouco mais de oito meses de vigência —a norma foi sancionada por Lula em 30 de agosto de 2023.

Para os economistas, a sucessão de furos no arcabouço pode impor custos à política fiscal no médio prazo.

“O mercado não respondeu à aprovação da mudança porque já estava na conta o aumento das despesas, mas não quer dizer que tem custo zero para a credibilidade”, diz Fabio Serrano, economista-sênior do BTG Pactual.

Para ele, o que mais chamou atenção foi a velocidade da negociação.

O jabuti —como são chamadas as matérias estranhas a um texto legislativo— foi incluído nos minutos finais da votação do projeto que recria o DPVAT, seguro que indeniza vítimas de acidente de trânsito.

O economista-chefe para Brasil no Banco Barclays, Roberto Secemski, afirma que o episódio enfraquece a credibilidade do arcabouço.

“A barra para mudanças ficou mais baixa. A gente viu como isso agora, de surpresa, sem nenhuma discussão prévia, foi feito na Câmara e pode evoluir com rapidez no Senado também”, diz.

Secemski afirma que, embora o mercado já esperasse a liberação dos R$ 15,7 bilhões em 2024, havia uma dúvida se os dados de maio permitiriam ao governo usufruir do potencial máximo desse crédito —já que ele é condicionado ao desempenho da arrecadação.

Segundo ele, a antecipação não permite uma avaliação completa da situação, como foi prescrito no arcabouço.

“Mais que os R$ 15 bilhões, a preocupação é o precedente que isso cria para novas mudanças daqui para frente. Vemos várias mudanças que sugerem um certo oportunismo na forma como o arcabouço é implementado”, afirma Secemski.

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