Prazo para desestatização do Porto Santos em 2022 ainda é apertado, avaliam advogados

Com pouco mais de três meses para o fim do ano e do atual mandato presidencial, o governo tem pouco tempo para realização do leilão de desestatização do Porto de Santos (SP) neste exercício. O Tribunal de Contas da União (TCU) tem dois meses e meio para a análise e deliberação dos documentos da desestatização do Porto de Santos (SP), encaminhados à Corte de Contas esta semana. Esse é o prazo para que a unidade técnica responsável pela instrução do processo de acompanhamento analise os documentos e encaminhe para deliberação sobre legalidade, legitimidade e economicidade dos atos, contando da data do recebimento da documentação.

O advogado Wesley Bento explicou que o prazo para apreciação somente será maior caso não sejam atendidas diligências determinadas pelas unidades técnicas do TCU ou o ministro-relator, Bruno Dantas, dilate o prazo, justificadamente, o que somente ocorre em situações excepcionais que podem ser exigidas pela magnitude e a complexidade do empreendimento.

“Após a conclusão da análise pelas unidades técnicas, não haverá maiores obstáculos, sobretudo porque há previsão de a unidade técnica do TCU apresentar relatório de acompanhamento para comentários dos gestores, para assegurar a celeridade do exame da matéria”, pontuou Bento, que é sócio do escritório Bento Muniz Advocacia, à Portos e Navios. Nesta semana, o governo aprovou o modelo e as condições para a privatização do Porto de Santos e encaminhou minuta do edital da privatização ao TCU. O ministro-relator do processo no TCU sinalizou que não haverá ‘empecilho’ para a desestatização do Porto de Santos, caso a documentação esteja adequada.

Para Bento, a realização da licitação ainda este ano é ‘altamente improvável’. O advogado considera que a regulamentação do TCU prevê prazo máximo de 75 dias em caso de conformidade da documentação pertinente ao processo de desestatização para exame dos atos pelas unidades técnicas do tribunal, ao que se seguirá pronunciamento da Corte de Contas. Bento comparou que, no caso da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), o projeto foi enviado ao TCU em agosto de 2021 e aprovado em dezembro daquele ano. “Ainda que ocorresse a publicação do edital este ano, dificilmente a apresentação das propostas e seu julgamento, muito menos a assinatura dos contratos, ocorreriam ainda em 2022”, analisou.

Bento entende que o processo de desestatização deve estar alinhado à intenção política. Ele considera que, não havendo impedimento jurídico ao prosseguimento da desestatização em 2023, caso o leilão não seja realizado em 2022, a condução sob o comando de autoridades distintas pode impactar decisivamente o futuro do projeto. O advogado ponderou que a experiência de gestão pública já demonstrou não ser suficiente atender às necessidades de expansão e melhorias na prestação do serviço.

Sob o ponto de vista procedimental, o advogado verifica regularidade no andamento do processo de desestatização em Santos. Bento considera que, apesar das críticas por parte de alguns setores quanto à restrição à participação de determinados agentes já estabelecidos no porto para este processo de desestatização, não foi identificado risco substancial ao andamento do projeto sob o ponto de vista jurídico.

Bento vê o processo da Codesa, já em fase de transição, como um projeto piloto da desestatização do maior complexo portuário da América Latina, já que ambos abrangem a alienação do controle acionário da autoridade portuária e a celebração de contrato de concessão. “Embora se espere maior complexidade da desestatização em Santos que na Codesa, em decorrência da dimensão do Porto de Santos, o debate com stakeholders que ensejou o processo de desestatização da Codesa contribuiu substancialmente para maturação do processo de desestatização”, comentou.

O advogado ressaltou que os dois dois processos integram um plano de desestatizações que busca alinhar o Brasil às diretrizes da OCDE e visam à melhoria da infraestrutura logística dos portos, sobretudo o aumento de suas capacidades, e buscam a eficiência no cumprimento das metas previstas no Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) centradas a partir da gestão por um parceiro privado. “As etapas necessárias à desestatização, inclusive a aprovação pelo TCU, já foram experimentadas no caso da Codesa e servem de parâmetro para a atuação na desestatização do Porto de Santos”, disse.

O advogado Willer Tomaz acredita que, não havendo pendências e estando perfeitamente cumpridas todas as exigências legais, os ministros do TCU aprovarão a minuta do edital, liberando a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) para publicar a versão definitiva da convocação do certame no Diário Oficial da União, quando então será iniciada a disputa entre as empresas licitantes, dentre as quais vencerá a que der o maior lance acima do mínimo fixado para a arrematação do terminal portuário.

“De modo geral, a privatização de estatais costuma demorar. Mas temos visto maior eficiência nas privatizações por parte da União nos últimos anos, sendo visíveis os esforços técnicos e políticos para que a privatização da gestão do Porto de Santos saia do papel ainda no corrente ano, dada a sua importância estratégica para a economia do país”, analisou o sócio-fundador da Willer Tomaz Advogados e sócio da Aragão & Tomaz Advogados. Tomaz ponderou que, após posição favorável do TCU, a conclusão do certame ainda dependerá de superar eventual judicialização — risco que, ainda que considerado remoto, sempre existe e foge do controle dos gestores públicos.

Marcus Pessanha, sócio do Schuch Advogados, concorda que o próprio trâmite regular do da licitação, incluindo os trâmites usuais do TCU e a necessidade de publicação de extratos de documentos como o edital, ainda pode ser objeto de impugnação por interessados e também vê como ‘pouco provável’ que tudo seja concluído ainda em 2022. “O trâmite interno do TCU envolve a análise por técnicos especializados ligados ao conselheiro responsável pelo exame. O processo não é muito extenso, mas as análises internas são bastante criteriosas, o que termina por levar algum tempo”, afirmou.

Pessanha entende que uma eventual troca de governo em 2023 não deveria gerar qualquer tipo de insegurança jurídica. No entanto, ele considera que, na prática, a substituição de gestores em posição chave, como presidências de estatais e de linhas de orientação política e econômica, impactarão a tramitação dos processos. “O mercado certamente está observando os movimentos eleitorais”, comentou o advogado.

Outro risco a ser considerado, segundo Pessanha, está ligado a uma forma de operação peculiar do porto após o processo de privatização. Ele disse que, em outras concessões, como no segmento de rodovias, o concessionário e o operador são do mesmo grupo, ao contrário do que ocorrerá no Porto de Santos, onde grande parte da operação já é particular. “Não podemos nos esquecer que existem terminais públicos cuja operação já é arrendada para a iniciativa privada. Essa simultaneidade de regimes jurídicos pode causar complicações na prática do dia-a-dia”, apontou.

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