Inflação oficial do Brasil acelera em fevereiro para 0,83%

Preços foram impactados pelos reajustes na educação; alta do IPCA ficou acima da mediana das projeções de mercado

 Stéfanie Rigamonti SÃO PAULO

inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), acelerou em fevereiro para 0,83%, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados nesta terça-feira (12).

O dado ficou acima da mediana das projeções levantadas pela Bloomberg. O consenso do mercado era de uma inflação a 0,79%.

O resultado foi impulsionado pelos efeitos dos reajustes sazonais na educação, pelos preços ainda elevados dos alimentos e pela alta na gasolina devido ao aumento do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre o combustível.

Ainda assim, esta é a menor inflação para o mês de fevereiro desde 2020, quando o IPCA registrou alta de 0,25%.

Consumidora faz compra no supermercado Chama, em Itaquera, na zona leste de São Paulo
Consumidora faz compra no supermercado Chama, em Itaquera, na zona leste de São Paulo – Rubens Cavallari/Folhapress

Em janeiro, o IPCA subiu 0,42%. No primeiro mês do ano, os preços ao consumidor também surpreenderam o mercado e foram impulsionados pela elevação dos alimentos e bebidas, impactados pelos efeitos do fenômeno climático El Niño.

Com o novo resultado de fevereiro, a inflação brasileira acumulou elevação de 4,5% nos últimos 12 meses, acima dos 4,44% projetados pelo mercado.

Apesar da surpresa negativa no índice cheio, a economista Luciana Rabelo Ribeiro, do Itaú BBA, destaca que, qualitativamente, a inflação veio um pouco melhor. Isso porque os núcleos, que retiram da análise itens mais voláteis para observar melhor a tendência de preços, obtiveram uma evolução positiva.

“A surpresa negativa veio concentrada nos preços dos alimentos e administrados [que seguem reajustes contratuais ou são regulados pelo setor público], como energia elétrica residencial”, diz Rabelo.

O economista Alexandre Maluf, da XP, diz que a leitura que ele faz do IPCA de fevereiro é neutra, ou seja, nos detalhes, veio em linha com o que o mercado esperava. “A alimentação no domicílio foi a maior surpresa que a gente teve no mês, basicamente por conta das frutas e sem grandes destaques. Isso diz muito pouco sobre o IPCA”, afirma.

“Em linhas gerais, a gente já sabia que o IPCA seria alto, muito por conta de uma alimentação forte, da gasolina, que a gente viu os efeitos da alta do ICMS no mês, e também pelos reajustes em educação, que já conhecíamos pelo IPCA-15“, afirma.

O índice de difusão, que mostra o quanto a inflação está espalhada entre os itens, ficou em 57% em fevereiro, depois de registrar taxa de 65% em janeiro.

EDUCAÇÃO TEM MAIOR IMPACTO

Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, sete tiveram alta em fevereiro. A educação foi responsável tanto pela maior variação, de 4,98%, quanto pelo maior impacto sobre o índice cheio, de 0,29 ponto percentual.

A maior contribuição para a alta em educação veio dos cursos regulares, devido aos reajustes sazonais no início do ano letivo. Dentro desse subgrupo, as maiores variações vieram do ensino médio, com alta de 8,51%, seguido do ensino fundamental (+8,24%), da pré-escola (+8,05%) e da creche (+6,03%).

Cursos técnicos, ensino superior e pós-graduação também registraram altas.

EL NIÑO SEGUE PRESSIONANDO

O grupo alimentação e bebidas também continuou sendo destaque no IPCA em fevereiro, com elevação de 0,95%, mas desacelerou ante o mês anterior, quando registrou alta de 1,38%.

A alimentação no domicílio subiu 1,12% em fevereiro, após alta de 1,81% em janeiro. Contribuíram para esse resultado as altas da cebola (7,37%), da batata-inglesa (6,79%), das frutas (3,74%), do arroz (3,69%) e do leite longa vida (3,49%).

Além disso, a alimentação fora do domicílio acelerou em relação ao mês anterior. O subitem refeição teve variação superior à observada em janeiro, enquanto o lanche desacelerou.

Assim como no mês anterior, os preços dos alimentos seguem sendo afetados pelo fenômeno El Niño.

“Historicamente os preços dos alimentos sobem no verão, com as chuvas e o calor afetando principalmente alimentos ‘in natura’, que são impactados pelos efeitos climáticos. Em 2023 e 2024, esse efeito foi intensificado pelo El Niño”, diz André Filipe Guedes Almeida, gerente da pesquisa do IPCA.

O grupo de transportes também teve participação importante no resultado, com elevação de 0,72%, após uma queda de 0,65% em janeiro.

Todos os combustíveis pesquisados pelo IBGE tiveram alta em fevereiro. Segundo Almeida, a gasolina foi o subitem que teve o maior impacto no IPCA, com elevação de 2,93%, devido ao aumento do ICMS sobre o combustível e o diesel desde 1º de fevereiro.

O subitem táxi também teve participação importante no grupo de transportes, com alta de 0,64%, devido aos reajustes da categoria em alguns estados.

Passagens aéreas, por sua vez, mais uma vez tiveram queda de preços de mais de 10%, após recuarem 15,22% em janeiro.

Além das passagens aéreas, outro subitem que ajudou a segurar os preços em fevereiro foi cinema, teatro e concertos, impactado por descontos relevantes em todo o Brasil devido à Semana do Cinema. Esse dado surpreendeu positivamente os analistas consultados pela Folha.

INFLAÇÃO DE SERVIÇOS

Com relação à inflação de serviços, item que tem sido acompanhado de perto pelo BC (Banco Central) em suas decisões de juros, houve desaceleração de 5,62% em janeiro para 5,25% em fevereiro.

“O movimento [da inflação de serviços] é de desaceleração no acumulado [de 12 meses], embora ainda acima do índice geral”, avalia Almeida.

Para Luciana Rabelo, do Itaú BBA, na análise do trimestre móvel, os preços de serviços bancários, que foram destaque em janeiro, devem dar uma arrefecida daqui para frente, compensando a normalização dos preços do cinema, que tiveram descontos pontuais no mês passado.

Ela diz que um ponto de atenção nesse sentido dentro dos serviços subjacentes, que mostram a real tendência de preços desse setor, são aqueles ligados à mão de obra, que têm a ver com o mercado de trabalho aquecido e altas salariais. “Então, isso deve ser algo a pressionar ao longo do ano”, afirma.

ATENÇÃO PARA AS PRÓXIMAS DECISÕES DE JUROS

Para Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, a inflação de fevereiro foi “bastante salgada”, com aumentos importantes na educação, alimentação e transportes. Por outro lado, os núcleos do IPCA e os serviços subjacentes vieram com uma evolução positiva.

O especialista diz que o resultado do mês passado, portanto, não muda o cenário projetado pelos analistas de corte de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros, Selic, na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária). Mas, segundo Gala, o BC pode mudar sua indicação futura.

“Eu acho que o Banco Central pode tirar o plural na próxima reunião [do Copom], na quarta-feira que vem, de que seguirão com cortes da mesma magnitude nas próximas reuniões. Talvez ele deixe que esse corte é para mais uma reunião só”, diz Gala.

“Lembrando que a gente começa o ano já com uma inflação de 1,25% para uma meta de 3%, então fica meio esquisito se o BC continuar dando essas indicações futuras de maneira indefinida”, completa.

Para Rafael Costa, analista e integrante do time de estratégia macro da BGC Liquidez, o ideal seria se houvesse um recuo mais expressivo dos preços de alimentação. No curto prazo, o cenário para ele é mais positivo. O longo prazo, porém, preocupa.

“A inflação dos serviços subjacentes continua registrando detalhes ruins que atrapalham o atingimento do centro da meta de inflação”, conclui.

Para este ano, o centro da meta de inflação perseguida pelo Banco Central em suas decisões de juros é de 3%. A tolerância é de 1,5 ponto percentual para menos ou para mais. Ou seja, a meta será cumprida se o IPCA ficar no intervalo de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).

Segundo a última edição do boletim Focus do Banco Central divulgada nesta terça-feira, com projeções de especialistas para os principais indicadores da economia brasileira, o IPCA deve fechar 2024 em 3,77%. A previsão está abaixo do teto da meta.

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