Pequim ainda quer conversar com EUA, mas comprará mais do Brasil, diz analista chinês

Para ex-conselheiro econômico Wang Huiyao, houve só ‘algumas medidas retaliatórias’, e o próprio Trump quer negociação

Nelson de SáPequim

Diante da ameaça de nova guerra comercial sino-americana, Wang Huiyao, ex-conselheiro econômico do Conselho de Estado, o ministério chinês, afirmou à Folha nesta terça-feira (4) que, “embora a China tenha adotado algumas medidas retaliatórias, ela ainda quer conversar, discutir” com os Estados Unidos.

Entre as contramedidas chinesas, que só devem entrar em vigor daqui a uma semana, a comissão de taxas alfandegárias do Conselho de Estado anunciou tarifas de 15% para carvão e GNL (gás natural liquefeito) e 10% para petróleo e equipamentos agrícolas –além de controles de exportação sobre os minerais tungstênio, telúrio, rutênio, molibdênio e itens relacionados ao rutênio, para “salvaguardar os interesses de segurança nacional”.

As medidas são uma resposta às novas tarifas sobre produtos chineses do presidente Donald Trump, que afirma buscar punir o país adversário por não interromper o fluxo de drogas ilícitas. A tarifa adicional de 10% de Trump sobre todas as importações chinesas para os EUA entrou em vigor nesta terça.

“Se esse é o propósito, acho que está bem”, diz ele. “A China quer conversar e quer um diálogo com todos os países, para que não entremos numa guerra comercial, que não é sustentável.” Segundo o analista, Trump procura “maximizar os interesses americanos”, atingindo interesses dos outros países, uma política que não tem como se manter por muito tempo.

“Se houver atrito comercial, a China certamente comprará mais do Brasil e da América Latina“, prevê Wang. “Com tarifas inclusive sobre outros países, [os EUA vão] empurrá-los para o comércio entre eles mesmos.”

O porta-voz do Ministério do Comércio chinês afirmou nesta terça, em resposta sobre as tarifas americanas: “Estamos prontos para trabalhar com outros membros da OMC (Organização Mundial do Comércio) para enfrentar os desafios colocados pelo unilateralismo e pelo protecionismo comercial”.

Uma fonte do governo brasileiro descreve as ações chinesas de retaliação como comedidas. Era necessário agir, até por razões políticas, e as escolhas feitas foram adequadas diante dos efeitos considerados limitados da tarifa americana de 10% –em parte porque hoje a participação dos EUA é menor, em relação à primeira guerra comercial.

Os chineses também escolheram adequadamente os produtos americanos atacados, a exemplo do que fizeram nas negociações com o primeiro governo Trump, segundo o funcionário brasileiro. No caso do gás, por exemplo, a importação havia sido uma concessão chinesa nos acordos fechados então. Foi apresentada como grande vitória por Trump, em visita ao país.

Sobre o eventual favorecimento do Brasil e da América Latina, que poderiam substituir os EUA em exportações agrícolas à China, por exemplo, a experiência da guerra comercial anterior indicaria que não. A esperança inicial de vender mais soja brasileira não se confirmou, e posteriormente houve até um acordo prevendo maior venda de soja americana, que também não se confirmou.

Em nota, a economista-chefe da consultoria Oxford Economics, Louise Loo, também avaliou que as contramedidas chinesas são, “por enquanto, um movimento mais simbólico”, alertando porém para uma eventual escalada, com mais tarifas por parte de Washington e a possível desvalorização do yuan por Pequim.

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