Investimento chinês no Brasil reage, mas segue abaixo dos anos de pico

Com US$ 1,73 bilhão em 2023, crescimento foi de 33% em relação a 2022; energia limpa concentrou 72% do total

Nelson de SáPequim

Os investimentos da China no Brasil alcançaram US$ 1,73 bilhão em 2023, crescimento de 33% em relação a 2022. Trata-se, no entanto, do segundo valor mais baixo ao longo dos últimos 15 anos, só ficando à frente do ano anterior.

Túlio Cariello, diretor de pesquisa da seção brasileira do CEBC (Conselho Empresarial Brasil-China), que produziu o relatório sobre investimentos, destaca dois fatores como explicação.

“O primeiro é que não houve, em 2023, projeto particularmente grande em termos de aporte de capital”, diz. “Não houve aporte tão intensivo como no início dos anos 2010, por exemplo, que foi quando aconteceram alguns dos maiores investimentos.”

Desta vez, os principais foram direcionados para as fábricas de carros elétricos da BYD e da GWM, principalmente com a entrada da primeira no Brasil. Ainda assim, são projetos de longo prazo, que levam a uma divisão, no relatório, dos valores bilionários anunciados para inversão.

“É uma questão metodológica”, diz Cariello. “Por exemplo, se a empresa diz que vai investir US$ 4 bilhões no Brasil nos próximos quatro anos, considera-se que em 2023, no ano um, só entra US$ 1 bilhão.”

A segunda explicação para o resultado relativamente baixo é o câmbio. Os investimentos são em geral realizados em dólar, por empresas que estão entrando pela primeira vez no país, com projeto específico.

“O real está hoje bem mais desvalorizado do que estava no início dos anos 2010, que foi quando a gente teve o maior valor total investido total no Brasil, chegando a US$ 13 bilhões, muito mais que no ano passado”, diz Cariello.

“E são projetos menos intensivos em capital”, acrescenta. “Até 2012, 2013, o Brasil teve investimentos grandes na área de eletricidade. Foi o momento em que entraram empresas como State Grid, China Three Gorges, adquirindo hidrelétricas e até fazendo projetos como o linhão de transmissão de Belo Monte.”

Segundo o levantamento, a elevação dos investimentos chineses no Brasil em 2023 ocorreu apesar da queda de 17% no capital estrangeiro que entrou de forma geral no país.

“Investimentos estrangeiros, no mundo, caíram em 2023”, diz Cariello. “Isso pode ser explicado por tensões geopolíticas, no leste europeu, no Oriente Médio, ali no próprio Mar do Sul da China. Também Estados Unidos e China disputando hegemonia em tecnologia. Elas acabam tendo influência na decisão dos investidores.”

As tensões estariam também favorecendo a transferência das inversões chinesas para outras regiões, casos do Brasil e dos países que participam da Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês), o programa chinês para infraestrutura no exterior.

Questionado se a entrada do Brasil na BRI, que vem sendo defendida por Pequim e cogitada publicamente pelo presidente Lula ainda para este ano, ampliaria as inversões chinesas no país, o diretor de pesquisa do CEBC evita responder, até porque a entidade não tem posição sobre o tema.

Observa apenas que “o Brasil já está no espírito do que é a proposta da Nova Rota da Seda”, outro nome para a BRI, em relação à prioridade dada à infraestrutura.

“Energia limpa é uma área em que os chineses são muito competitivos e querem ser reconhecidos como país na vanguarda do desenvolvimento. E aí o Brasil é candidato forte a receber os investimentos.”

Também chama a atenção que os estados brasileiros que mais atraíram projetos da China no ano passado tenham sido São Paulo (39%), Minas Gerais (29%) e Goiás (10%), com governadores de oposição e possíveis candidatos à Presidência. Bahia e Ceará, governados pelo PT, receberam 6% cada um.

“O investimento chinês é absolutamente pragmático”, diz Cariello. “Tanto é que, durante o governo Bolsonaro, o mais crítico à China que houve no Brasil, saíram do papel grandes projetos, e o comércio bateu recordes ano após ano. E candidatos de direita, de uma forma ou de outra, acabam se interessando também pelos projetos chineses. É uma relação independente de cor partidária. Acaba prevalecendo o pragmatismo.”

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